
Eu sou a Beatriz Sallet, eu moro em São Leopoldo, sou professora universitária na área de fotografia – já há 12 anos. Fotografo há bem mais tempo, iniciei a minha carreira como fotojornalista, minha formação é jornalismo, fotografei durante cerca de 15 anos para redações de jornais impressos aqui no Rio Grande do Sul e depois passei para a universidade – mestrado, doutorado – e para a carreira docente. Fotografei como fotojornalista até o ano de 2014 e a partir de então foquei só na universidade e em fotografia de família, que eu gosto muito… que é o que eu faço hoje, quando eu tenho tempo na agenda.
Nítida: Tu percebes alguma discriminação de gênero na fotografia?
Beatriz: Percebo, e hoje eu percebo bem menos do que eu percebi quando eu iniciei minha carreira. Quando eu iniciei a minha carreira, logo após a formação em jornalismo, eu bati em muitas portas para conseguir emprego como repórter fotográfica em jornais, por conta da minha formação, era o que eu gostava, era o que eu queria pra mim e recebi vários nãos: jornal NH, jornal Correio do Povo… vários jornais diziam “não” e os homens editores tinham sempre como justificativa o fato – que era da cultura, né – de pensar que a editoria de fotografia dos jornais era espaço masculino. Eram muito poucos que entendiam que a mulher também poderia ter acesso. Eu fiz um estágio voluntário no laboratório de fotografia do Correio do Povo e quando terminou o estágio eu fui pedir para ser fotógrafa e me disseram que não, que desde a época do Breno Caldas no Correio do Povo mulher não fazia parte do espaço da fotografia. E aí eu fui conseguir o meu primeiro trabalho como repórter fotográfica no jornal Vale dos Sinos, em São Leopoldo, no ano de 1996, e fui muito feliz lá.
N: Tu comentaste comigo, na Unisinos, sobre o número de mulheres que estavam no curso. Tu podes falar mais sobre isso? Tu foste coordenadora do curso durante muito tempo também, né….
B: Isso. A gente desenvolveu o projeto político pedagógico da Unisinos, do curso de fotografia, graduação tecnológica, e eu coordenei o curso por seis anos e ajudei a desenvolver o curso para Porto Alegre – que estão funcionando os dois, o da Unisinos São Leopoldo e o da Unisinos Porto Alegre – e desde sempre a procura pela fotografia sempre foi feminina, na maioria. Como, diga-se de passagem, também nos cursos de comunicação, que eu venho atuando como professora de fotografia – jornalismo, publicidade, relações públicas – a grande maioria dos cursos, da procura pelos cursos de comunicação e fotografia é feminina. As mulheres são a maioria. A gente está mudando essa cultura, ainda bem, né, em tempo… já é uma dívida histórica-social que os homens têm para com a gente e somos nós mulheres que estamos mudando essa cultura machista e devemos não sossegar, né. A gente precisa continuar na luta e criar as nossas meninas para a autonomia e para serem combatentes.

N: O que tu entendes por feminismo e tu te consideras feminista?
B: Eu entendo por feminismo justamente essa luta que se iniciou com o próprio movimento, em nível mundial, e que se espalhou por todos os espaços e que graças às mulheres que têm uma visão maior, que lutaram e que lutam, desde o sufrágio, desde a luta pelo sufrágio, todo o histórico do movimento feminista em nível mundial, como eu citei, mas que desde sempre vem lutando por ter o mesmo reconhecimento social que os homens têm. A gente foi criada num contexto social em que os homens sempre tiveram o espaço público, a esfera pública, a ágora pública destinada a eles, ao debate, ao pensamento, aos campos em confronto, o campo político, principalmente, o campo econômico, e os grandes espaços no mercado de trabalho, né, sempre marcados pelo mundo masculino. E as mulheres… claro que a gente entende toda a nossa fisiologia e a nossa biologia que nos predestinou, num primeiro momento, antes da pílula, da chegada da pílula e da revolução sexual, e da nossa própria liberdade sexual, e escolha sexual como mulheres, de viver a nossa vida como a gente bem entende, e não querer ter filhos, inclusive – escolher ter ou não ter filhos, que hoje é uma realidade, ainda bem – e tantas outras questões, né, que são da luta feminina… então o espaço doméstico, o espaço privado da mulher historicamente se deu em função de que ela não tinha muita escolha, os filhos vinham porque não tinha muito como evitá-los. A partir de então, do que a gente sabe, de todos os acontecimentos, por conta da medicina, que também nos possibilitaram adquirir uma liberdade do nosso corpo, das nossas escolhas e hoje podendo estar aí, né… Copa feminina, etc.
N: Faltou responder se tu te consideras feminista…
B: Então… eu creio que sim. Eu sou uma mulher que cria uma outra mulher, sozinha, já há bastante tempo. Eu sempre criei a minha filha para a autonomia, tenho um respeito absoluto tanto por meninos quanto por meninas e cuido também nessa questão como educadora, como professora, de pensar que a nossa responsabilidade não está só em criar as meninas para a autonomia, mas também educar os meninos para respeitar as meninas e construir juntos um mundo melhor, né. Eu me considero, sim, feminista.
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Contato: @beatriz_sallet