Cindy Sherman é uma fotógrafa norte-americana famosa por seus autorretratos que discutem, de diversas formas, os papéis impostos às mulheres – pela sociedade, pela mídia, pela arte. É considerada uma das artistas mais importantes da atualidade, tendo exposto suas obras nos principais museus do mundo. Ela trabalha regularmente em projetos de fotografia e vídeo desde os anos 70 até os dias de hoje.
“Através da fotografia você pode fazer as pessoas acreditarem em qualquer coisa… Então não é a câmera fazendo e sim a pessoa que está atrás dela […] Algumas pessoas usam a câmera para documentar o que eles veem, mas eu acho mais interessante mostrar o que talvez você nunca vai ver.”
Cynthia Morris Sherman nasceu no estado de New Jersey, EUA, em 1954. Aos dez anos ganhou uma Brownie Camera do pai e, a partir de então, passou a fotografar seus amigos. Cindy também gostava muito de desenhar e, provavelmente por esse motivo, decidiu estudar artes na State University of New York, em Buffalo. No início da faculdade ela se dedicou a desenhos e pinturas realistas mas, após perceber que estava fazendo apenas cópias, ela se deu conta de que o lápis e o pincel não seriam a sua forma de expressão.
“… não tem mais nada para se dizer [através da pintura]. Eu estava meticulosamente copiando a arte dos outros e então eu percebi que eu poderia apenas usar uma câmera e colocar o meu tempo em uma ideia.”
A artista, em um primeiro momento, não tinha a intenção de ser fotógrafa e teve, inclusive, algumas críticas e dificuldades em relação à técnica fotográfica. Mas, especialmente quando conheceu e teve aulas com Barbara Jo Revelle, Cindy se convenceu de que a técnica era tão importante quanto o conceito das imagens. “A máquina fotográfica é apenas uma ferramenta. Poderia ser um pincel, exceto pelo fato de demorar mais para fazer as imagens que eu gostaria.”
Apesar de ter feito retratos de outras pessoas, a fotógrafa percebeu desde cedo que seu principal personagem seria ela mesma – pois era quem ela mais conhecia e, assim, seria possível se transformar em diversas personas. Quando criança, Cindy gostava muito de se vestir com roupas da avó, e confessa que desde aquela época não gostava de parecer a “garota bonita”, pelo contrário, gostava de parecer “pessoas mais velhas e até monstros”.
No final dos anos 70, após concluir a faculdade, a fotógrafa muda-se para Nova York e vê-se diante de uma nova realidade. No documentário “Nobody’s here but me” ela comenta que ficou chocada ao sair nas ruas e ver como as pessoas a tratavam. Portanto, para se sentir mais confortável ao andar na cidade, ela passou a criar personagens e mudar algumas coisas de sua aparência.
É também nessa época que ela desenvolve uma de suas séries mais famosas até hoje: Untitled Film Stills. Nesse trabalho a fotógrafa interpreta estereótipos femininos inspirados em filmes hollywoodianos, Noir e B movies dos anos 50 e 60. As fotografias, apesar de serem ficcionais e produzidas totalmente pela artista, parecem realmente ter saído de um filme. Cada uma das imagens conta uma história, como se tivesse uma trama por trás daquela cena.
Lidar com uma narrativa de cinema, como podemos ver por suas próprias palavras, não foi por acaso: “Acho que filmes são umas das minhas maiores influências; e meus filmes favoritos são os de terror”. O gosto por temas relacionados ao horror aparecerão em trabalhos futuros.
É importante destacar que Cindy, além de fotografar e ser a modelo, faz toda a concepção de cenários, figurinos e montagem. Sua rotina de trabalho é bastante solitária e ela acredita na ideia de que suas fotografias não se tratam de autorretratos. Suas obras vão além disso: é como se ela fosse um quadro vazio e, através das maquiagens, roupas e poses, pudesse produzir uma infinita sucessão de papéis femininos. Como se ela fosse, de fato, todas as mulheres.
Durante os anos 80 a artista produziu diversas séries, entre elas a Centerfolds, que traz fotografias mais íntimas de personagens em diversos estados emocionais. Com esse trabalho, ela faz um jogo em relação ao ato de ver e fotografar: como se fosse um homem fotografando as mulheres naquelas situações – já que é esse o padrão que se repete em toda a história da arte.
Em Fashion, iniciada em 1983 e complementada na década de 90, Cindy faz paródias com a típica fotografia de moda para, assim, criticar essa indústria e a forma que ela lida com os gêneros e comportamentos. Seguiram-se as séries Fairy Tales e Disasters, onde a artista faz narrativas mais grotescas e macabras e, por algum momento, desaparece como personagem. Ela passa a não aparecer mais na maioria das fotografias dos anos 90, quando faz Sex Pictures e, a partir daí, segue uma linha de retratar bonecas e bonecos híbridos e bizarros.
Ainda no final dos anos 80, a fotógrafa desenvolve History Portraits. A série traz retratos feitos de forma clássica, e muitas vezes teatrais e artificiais, para imitar pinturas de alguns períodos da história da arte. Dessa vez, ela também é retratada como personagem masculino, mas novamente é feita relação de quem retrata (ligado ao masculino, pois foram homens a maioria dos pintores daquela época) e o retratado (a mulher em suas já conhecidas formas de ser apresentada).
Depois de uma década escondida atrás das câmeras, Cindy volta a ser o personagem principal em Headshots (2000-2002), que novamente faz alusão ao cinema – são fotografias, inspiradas no estilo 3×4, de supostas atrizes que se candidatam a trabalhos em Hollywood. A série Clowns, nos anos seguintes, busca trazer uma grande variedade de estados emocionais através das diversas camadas contidas no rosto de um palhaço. Em 2008, a artista segue criando novas formas de brincar com os papéis do gênero feminino em Society Portraits.
Cindy Sherman é uma mulher reconhecida internacionalmente por seus trabalhos de grande destaque e relevância dentro do mundo das artes e da fotografia. Em 2011, a foto Untitled #96, da série Centerfolds, foi vendida por U$ 3,89 milhões de dólares, atingindo, na época, o preço máximo pago à uma fotografia dentro de toda a história (atualmente essa posição é de Andreas Gurksky, com uma obra que superou esse valor). No ano de 2012, o MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York) realizou uma enorme exposição com uma completa retrospectiva do trabalho da fotógrafa.
Apesar de Cindy não se considerar politicamente engajada e ligada ao feminismo, seu trabalho é constantemente usado para falar sobre questões totalmente relacionadas à causa feminista. É difícil, e nem deve ser necessário, desvencilhar essas duas coisas, pois os temas escolhidos pela artista, além de sua forma de abordagem, são de extrema importância para pensarmos sobre o lugar que a mulher ainda ocupa nos diversos âmbitos da cultura e sociedade.



Untitled Film Stills
Centerfolds
Fashion
Fairy Tales, Disasters, Sex Pictures e Dolls
History Portaits
Headshots
Clowns

Society Portraits
LIVROS
- The Essentinal: Cindy Sherman, 1999
- Cindy Sherman: Retrospective, 2000
- Early Work of Cindy Sherman, 2001
- Cindy Sherman: Selected Works: 1975 – 1995, 2002
- Cindy Sherman: The Complete Untitled Film Stills, 2003
- Cindy Sherman: Centerfolds, 2004
FILMES
- Diretora em: Office Killer
- Documentário: “Nobody’s here but me”, 1994
REFERÊNCIAS
FRIEDEWALD, Boris. Women Photographers: From Julia Margaret Cameron to Cindy Sherman. Prestel, 2014.
HORWITZ, Margot F. A Female Focus: Great women photographers. Franklin Watts, 1996.
Documentário “Nobody’s here but me”
The Guardian “I’m every woman”